O Vestuário Israelita
Artigo publicado pela revista oficial dos ASD movimento de reforma em 1996
O primeiro homem e a primeira mulher andavam nus (Gênesis 2:25); quer dizer, embora não estivessem vestidos, uma luz angelical os circundava (História da Redenção, pág. 38). Segundo a inspiração, “estavam revestidos de uma cobertura de glória e luz, tal como a usam os anjos”. — Patriarcas e Profetas, pág. 29. “A veste branca da inocência foi usada por
nossos primeiros pais, quando foram postos por Deus no Santo Éden. ...Luz bela e suave, a luz de Deus envolvia o santo par. Esse vestido de luz era um símbolo de suas vestes espirituais
de celeste inocência.” —Parábolas de Jesus, pág. 310. Enquanto viveram em obediência a Deus, esta veste de luz continuou a envolvê-los.
Ao entrar o pecado, porém, cortaram sua ligação com Deus, e desapareceu a luz que os aureolava. Nus e envergonhados, trataram de procurar suprir os vestidos celestiais, cosendo folhas de figueira para uma cobertura (Gênesis 3:7). Remonta daí o costume de os seres humanos usarem roupa, no intuito de aliviar o senso de carência, nudez e vergonha que experimentam diante de Deus, dos anjos e de seus semelhantes. Como o alimento e o abrigo, a roupa também passou a ser uma necessidade humana básica.
A Indumentária, que é o estudo dos trajes antigos, poucas informações nos fornece sobre a maneira de vestir dos hebreus. Isto porque, diferentemente Israel não tinha o costume de celebrar seus feitos militares fazendo inscrições ou erigindo monumentos com figuras humanas que pudessem dar ideia de seu estilo de vestir. É provável, porém, que algumas das roupas usadas hoje pelo povo das terras bíblicas, a despeito da influência cultural exercida no decurso do tempo pelas civilizações grega, romana e ocidental, sejam comparativamente similares às que se usavam séculos atrás, haja vista a serventia das roupas ainda aos mesmos propósitos e a permanência inalterada dos costumes ao longo dos séculos.
1. Materiais e cores
O mais antigo material usado no fabrico de roupa de que se tem notícia foram folhas de figueira, usadas por Adão e Eva, que coseram aventais para si (Gênesis 3:7). Posteriormente, Deus fez túnicas de peles para eles, e os vestiu (verso 21). Elias, Eliseu e João Batista usavam “vestes de pêlos”, tendo os lombos cingidos dum cinto de couro, espécie de traje oficial do ministério profético (2 Reis 1:8; 2:13; Hebreus 11:37; Mateus 3:4).
As vestes de sacos (Gênesis 37:34), usadas sobre a pele para mortificação, em momentos de luto ou tristeza eram feitas de crina (Apocalipse 6:12). Contudo, o material mais comum era mesmo o linho e a lã (Levítico 13:47-49; Provérbios 31:13). Os pobres confeccionavam suas roupas de matéria mais grosseira feita à base de pêlo de cabra e de camelo, embora a lã também fosse empregada. O linho era o tecido mais caro. Raramente usava-se o algodão, visto não ser planta nativa. A seda só é mencionada na Bíblia uma vez, alistada como artigo comercial de Babilônia a grande (Apocalipse 18:12).
Evidências arqueológicas parecem mostrar a predileção que os hebreus tinham pelas roupas coloridas. As peças de vestuário eram geralmente de cores vivas e variadas, listradas ou bordadas (Juízes 5:30). Havia grande variedade na configuração do tecido. A vestimenta do sumo sacerdote, por exemplo, era uma túnica enxadrezada (Êxodo 28:39). Os israelitas não participantes da classe sacerdotal podiam usar uma peça de linho e outra de lã, mas era terminantemente proibido vestir roupa tecida com duas ou mais espécies de fios ou vestir-se de estofo misturado de lã e linho juntamente (Levítico 19:19; Deuteronômio 22:11). Além disso, proibia-se a mulher vestir roupa de homem, e vice-versa (Deuteronômio 22:5).
2. Roupas
O termo genérico para designar roupa no Antigo Testamento é beghedh. Empregam-se outros termos, às vezes em sentido lato, embora também apareça em outros lugares como se aplicando a artigos específicos. As peças essenciais dos trajes do homem e da mulher eram três: uma túnica cingida por um cinto, um manto e uma capa.
2.1. Roupas Internas.
As roupas internas consistiam de cuecas, camisa e túnica.
A. Cuecas. Ao que parece, havia tanto para homens quanto para mulheres uma peça íntima na forma de tanga ou talvez cuecas, coladas à pele, já que a nudez absoluta era vergonhosa. Integrando as vestes sacerdotais, estavam os “calções” de linho, que se estendiam desde os lombos até as coxas, e que os sacerdotes tinham o dever de usar para cobrir a pele nua, a fim de impedir a indecente exposição das partes quando se chegassem ao altar (Êxodo 28:42, 43).
B. Camisa. O sadhin (do heb. “vestido diáfano”) era uma peça de roupa usada por ambos os sexos (Isaías 3:23). Creem alguns se tratar de uma espécie de combinação para ser vestida sob a túnica, mas que agricultores, pescadores, carpinteiros, tosadores de lã, apanhadores de água e outros trabalhadores braçais usavam sem cobertura. Quando utilizado por baixo da roupa externa, o sadhin assemelhava-se a uma camisa com mangas que alcançava os joelhos, podendo ser usada com ou sem faixa. Era feito de linho ou lã.
C. Túnica. O kuttoneth (do heb. “túnica”), ou como era chamado na língua grega, khiton, era uma espécie de vestido. Ambos os termos eram amplamente usados para se referir a uma túnica ou vestido de mangas longas ou curtas, que atingiam os joelhos ou tornozelos. Era o traje caseiro, da vida familiar, e dos arredores do ambiente doméstico. De acordo com alguns estilos do kuttoneth ou khiton, o tecido podia envolver um ombro, deixando o outro descoberto, ou a ambos, e ser branco ou de variadas cores. E provável que o modelo mais longo tivesse aberturas laterais de 30 centímetros a partir da orla, para facilitar as passadas, pois costumava ser justo ao corpo (ver Judas 23). Alguns eram feitos de linho, se bem que a maioria possivelmente fosse de lã, sobretudo entre os pobres. Esta peça de vestuário também era usada por ambos os sexos, posto que a túnica feminina fosse mais longa.
Kuttoneth é o termo amplamente empregado na Bíblia para designar, entre outras coisas, a veste sacerdotal (Êxodo 28:39, 40); a túnica colorida de José (Gênesis 37:3); a túnica talar de Tamar que ela rasgou em dor e humilhação (2 Samuel 13:18); a túnica inconsútil de Cristo sobre a qual os soldados lançaram sorte (João 19:23, 24).
2.2 Roupas Externas.
As roupas externas dividiam-se comumente em manto e capa.
A. Manto. Sem mangas e muitas vezes aberto na frente, o meil (do heb. “manto”) era uma vestimenta folgada que se vestia por cima da túnica. Não era de uso restrito ao sacerdócio (Levítico 8:7), mas um item comum do vestuário. Samuel, Saul, Davi, bem como Jó e seus companheiros são mencionados como usando mantos (1 Samuel 2:19; 15:27; 24:4; 1 Crônicas 15:27; Jó 1:20; 2:12). Em todos os casos fica bastante claro que se faz referência a uma peça de roupa secundária ou sobressalente, vestida sobre outra. A Septuaginta traduz muitas vezes a palavra meil para o grego stolê e himation, termos que denotam um peça de roupa sobreposta. Este componente do vestuário era por vezes mais longo do que o kuttoneth (túnica).
O stolê (do gr. “manto”) do Novo Testamento era um imponente manto branco que descia até os pés. Jesus censurou os escribas, cujo maior prazer era ostentar esse tipo de veste comprida nos logradouros públicos a fim de chamar a atenção e impressionar as pessoas com a sua importância (Lucas 20:46). O anjo que estava à direita do sepulcro de Jesus trajava um stolê (Marcos 16:5). Foi esse tipo de roupa, “a melhor”, que foi posta sobre o filho pródigo quando de sua volta (Lucas 15:22). E os servos martirizados vistos por João ao ser aberto o quinto selo, vestiam também o stolê (Apocalipse 6:1), bem como a multidão de remidos (Apocalipse 7:9, 13, 14).
Sthés (gr.) geralmente se referia a uma veste ou manto ornamentado, pomposo. Os anjos apareciam nesse traje (Lucas 24:4). Herodes, escarnecendo de Jesus, vestiu-O com uma roupa resplandecente (Lucas 23:11). Depois de os soldados O haverem açoitado por ordem de Pilatos, vestiram-Lhe um manto escarlate (gr. khlamys, Mateus 27:28,31) ou um manto púrpura (gr. himation, João 19:2,5). Este era um manto usado por reis, magistrados, oficiais militares etc.
B. Capa. O simlah (heb. “capa”), feito de lã, linho ou pêlo de cabra, e em alguns casos de pele de ovelha ou de cabra, era das roupas externas a maior, a mais pesada e a mais popular. Rasgava-se muitas vezes a capa para indicar tristeza (Gênesis 37:34; 44:13; Josué 7:6). Parecia consistir de uma peça de tecido retangular, geralmente colocada em volta do ombro esquerdo passando por baixo do braço direito, como a tiracolo, para proteger do frio. No mau tempo era ajustada firmemente ao corpo, sobre ambos os braços e mesmo sobre a cabeça. Apresentava-se ocasionalmente em formato quadrado com orifícios para os braços. Em alguns casos, assemelhava-se ao nosso xale, sendo usado como cobertura (Gênesis 9:23), como roupa de cama (Êxodo 22:27; Deuteronômio 22:17) ou para atar coisas aos ombros (Êxodo 12:34; Juízes 8:25).
O simlah era usado tanto por homens quanto mulheres, sendo que o das mulheres se distinguia pelo tamanho, cor e decoração do bordado. Um pobre podia possuir apenas um simlah, ao passo que um rico tinha várias mudas (Êxodo 22:27; Deuteronômio 10:18; Gênesis 45:22). Visto que este componente do vestuário era o agasalho dos pobres durante as noites de frio, era proibido tomar em penhor a capa da viúva ou reter após o pôr-do-sol a capa do pobre (Deuteronômio 24:13,17).
O himation (do gr. “roupa externa”) do Novo Testamento equivalia em grande parte ao simlah do Antigo Testamento. Em alguns casos parecia consistir de uma peça retangular de tecido, fácil de vestir e de conduzir. Geralmente era retirada quando o dono se empenhava em trabalho próximo (Mateus 24:18; Marcos 10:50; João 3:4; Atos 7:58). Jesus Se referiu a este artigo de vestuário quando disse: “Ao que te houver tirado a capa [himation], não lhe negues também a túnica [khitona].” Lucas 6:29. Ele Se refere aqui a um caso de remoção ilegal e forçada, em que a roupa exterior seria obviamente a primeira a ser arrebatada. Em Mateus 5:40, a ordem é invertida. Aí se discute uma ação legal, na qual os juízes podiam adjudicar à parte queixosa o khiton (túnica) em primeiro lugar, visto ser essa peça a de menor valor.
O phelonês esquecido em Trôade que Paulo pede a Timóteo para trazer-lhe na prisão, era provavelmente uma capa de viagem para proteger-se contra o tempo frio e tempestuoso (2 Timóteo 4:13).
O addereth (heb.) era uma capa oficial do cargo de profeta e rei (2 Reis 2:8; Jonas 3:6). A capa do profeta era feita de pêlo de cabra ou camelo (2 Reis 1:8; Mateus 3:4; Marcos 1:6). Elias apontou Eliseu como seu sucessor lançando sobre ele seu addereth, e Eliseu tomou-a quando seu mestre foi assunto ao Céu (1 Reis 19:19; 2 Reis 2:13). A “boa capa babilônica” furtada por Acã era um addereth real (Josué 7:1, 21).
A palavra grega endyma é genérica, sendo empregada com referência à veste nupcial (Mateus 22:11, 12), às vestes do anjo no túmulo de Jesus (Mateus 28:3), à veste de pêlos de camelo de João Batista e às vestes de modo geral (Mateus 3:4; 6:25, 28; Lucas 12:23).
3. Acessórios
3.1 Faixa, Cinto ou Cinta.
Usava-se muitas vezes a faixa — banda de tecido que serve para cingir a cintura — sobre roupas interna e externas. Quando alguém se empenhava em alguma forma de atividade física ou trabalho, “cingia os lombos”, isto é, prendia as extremidades da túnica com a faixa para ter maior liberdade de movimento (1 Reis 18:46; 2 Reis 4:29; 9:1). O sumo sacerdote usava uma faixa bordada em azul, púrpura e carmesim sobre a túnica de linho (Êxodo 28:4, 8, 39; 39:29).
O cinto ou cinta — tira de pano ou couro — era um item comumente empregado para prender à cintura adagas ou espada, dinheiro, tinteiro de escrivão etc. (Juízes 3:16; 2 Samuel 20:8; Ezequiel 9:3). Elias tinha os lombos cingidos de um cinto (do heb. ezhor) de couro, assim como João Batista usava um cinto (do gr. zone) de couro em tomo dos lombos (2 Reis 1:8; Mateus 3:4).
3.2 Franjas e Borlas. Deus ordenou aos filhos de Israel que fizessem para si franjas nas bordas de suas vestes, e que pusessem nas franjas das bordas um cordão azul, “para distingui-los das nações em volta, e significar que eram o povo peculiar de Deus”. 2 ME 473.
As borlas, ou pingentes, eram postas nos quatro cantos da capa (Deuteronômio 22:12). A aba do manto do sumo sacerdote era franjada com campainhas de ouro e romãs de azul, púrpura e carmesim alternadas (Êxodo 28:33, 34).
3.3 Alfinetes.
Para fechar a roupa ou prender as faixas, os hebreus usavam alfinetes articulados, semelhantes aos broches. Espécimes encontrados no Oriente Médio consistem de uma pequena haste metálica, com ponta em uma das extremidades e com uma perfuração no meio semelhante a um buraco de agulha, por onde passa um cordão. Para fechar a roupa, introduzia-se o alfinete no pano e enrolava-se o cordão em tomo da extremidade saliente do alfinete.
3.4 Calçados.
O tipo de calçado mais comum era a sandália, espécie de sapato rudimentar usado fora de casa, feito de sola de madeira, ou de couro, apertada ao pé nu por meio de correias, passando pelo peito do pé e à roda dos artelhos (Gênesis 14:23; Isaías 5:27; Atos 12:8). Deus fala de calçar Israel com pele de foca, melhor couro da época (Ezequiel 16:10). Diz-se que os sacerdotes de Israel ministravam descalços no tabernáculo ou templo (Êxodo 3:5; Josué 5:15; Atos 7:33). Mas sair de casa descalço era sinal de dor ou humilhação (2 Samuel 15:30; Isaías 20:2-5).
3.5 Coberturas Para a Cabeça.
O povo comum andava com a cabeça descoberta. Às vezes traziam turbante, toucado formado por um longo pedaço de fazenda que se enrolava em volta da cabeça (Jó 29:14; Isaías 3:20; Ezequiel 23:20). Na maioria das vezes, porém, serviam-se da capa. O véu (do gr. peribolaion, “xale”) que o apóstolo Paulo menciona em ligação com o símbolo de sujeição da mulher é diferente do véu (pano transparente usado para cobrir o rosto e a cabeça) que Moisés pôs sobre o rosto resplandecente (Êxodo 34:33-35; 2 Coríntios 3:13) e com o qual (heb. tsaiph, “xale”) Rebeca cobriu a cabeça quando encontrou Isaque, seu noivo (Gênesis 24:65).
Bibliografia
Insight on the Scriptures, 2 vols. Verbete “Dress”, 1988, Watch Tower. Dicionário da Bíblia, John Davis, 1984, Juerp.
Fonte: Revista Observador da Verdade, janeiro/fevereiro de 1996
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